Após 18 dias de revolta popular, classe trabalhadora equatoriana obtém vitória frente ao governo do banqueiro Guillermo Lasso, que se comprometeu a atender a reivindicações de proletários e indígenas. em prazo de três meses
por Apo Corã
O mês de junho marcou um período intenso de protestos liderados por organizações indígenas que reivindicavam melhores condições de vida para os equatorianos. Com serviços precários de saúde e educação, a população vem sendo fustigada ainda pelo desemprego, pela alta dos preços dos combustíveis, dos alimentos e da moradia. De um lado, um presidente que representa os interesses imperialistas dos EUA, o banqueiro Guillermo Lasso; de outro, as organizações indígenas, lideradas sobretudo pela Confederação das Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie).
Devido a sua posição geográfica, o país Equador é associado à linha que divide o planeta Terra em dois hemisférios iguais, a linha do Equador. No âmbito social, porém, sempre viveu uma realidade diferente daquela sugerida por seu nome. Desde 13 de junho, quando os protestos contra o governo de Guillermo Lasso se iniciaram, os povos e nacionalidades indígenas, liderados sobretudo pela Conaie, buscam mudar o cenário de desigualdade extrema que deixou uma parte significativa dos povos originários em situação de miséria.
A assembleia de 20 de maio, organizada pelo Movimento Indígena e pela Conaie, decidiu por uma greve nacional (paro nacional indefinido) e contou com a participação da Confeniae (Confederação das Nacionalidades Indígenas da Amazônia Equatoriana), Ecuarunari (Confederação dos Povos da Nacionalidade de Kichwa), Conaice Costa (Confederação de Nacionalidades e Povos Indígenas da Costa Equatoriana), dentre outras representações. A greve se deveu ao aumento do custo de vida e do desemprego; há uma grande desigualdade no acesso a serviços básicos de saúde, educação, moradia, água, alimentos; o preço da gasolina subiu cerca de 45 por cento. A Conaie e o Movimento Indígena listaram dez tópicos como reivindicações da greve nacional:
- Redução e não mais aumentos dos preços dos combustíveis;
- Moratória de mínimo um ano no sistema financeiro para que as famílias possam pagar suas dívidas;
- Preços justos nos produtos do campo;
- Emprego e direitos trabalhistas;
- Não mais mineradoras nos territórios indígenas nem nas fontes de água;
- Respeito aos 21 direitos coletivos;
- A não privatização dos setores estratégicos;
- Políticas de controle na especulação de preços;
- Orçamento urgente para a saúde e educação;
- Políticas públicas de segurança e proteção.
Contra o imperialismo
Fundada em 1986, a Conaie foi agrega as nacionalidades indígenas equatorianas Quichua, Shuar-Achuar, Chachi, Tsachila, Siona-Secoya, Huaorani, Cofan, Awa, Epera. Em seu projeto político, propõe uma nova constituição, reforma na administração pública, autonomia e direito indígena, reorganização dos territórios de povos e nacionalidades indígenas, consolidação da autonomia e do direito indígena, Eceplan (Economia Comunitária Ecológica Planificada), reforma agrária, valorização da cultura indígena, educação bilíngue intercultural científica e humanista.
A Conaie luta contra problemas estruturais que surgiram durante a colonização e que geraram uma política excludente, antidemocrática, repressiva e pró-imperialista. Nesse sentido, busca solucionar os problemas de terra e territorialidade, industrialização, desemprego e subemprego, moradia, educação, saúde, discriminação e segregação racial.
Dentre os princípios políticos ideológicos da Conaie há: humanismo integral; comunitarismo (igualdade econômica, política, cultural, tecnológica e científica, satisfação das necessidades materiais e espirituais, desenvolvimento humano e preservação da natureza); democracia plurinacional comunitária; plurinacionalismo; unidade na diversidade; autodeterminação; soberania; independência; solidariedade internacional.
Repressão
A luta popular encabeçada pela Conaie possui objetivos conflitantes aos do atual presidente banqueiro Guillermo Lasso, que atuou de forma repressora e antidemocrática contra os protestos que ocorreram no mês de junho.
O presidente da Conaie, Leonidas Iza, foi sequestrado e ficou incomunicável por várias horas na madrugada de 14 para 15 de junho. Iza foi levado a uma base militar e solto depois de 24 horas, sob a acusação de paralisar o transporte público. Em 18 de junho, o carro de Iza foi alvejado por um tiro, num atentado que só não resultou em feridos devido à blindagem do veículo.
Desde o início das manifestações, Lasso as reprimiu de forma brutal e inconstitucional. Houve ataques da polícia, prisões ilegais e mesmo assassinatos, vitimando até crianças e idosos. As mobilizações contra o governo aumentaram paulatinamente, contando com o apoio de professores, estudantes e diversas categorias de trabalhadores. Oito em cada dez equatorianos não acreditam no presidente e 82% avaliam sua gestão como ruim ou muito ruim.
O governo de Lasso instaurou o estado de exceção em várias províncias equatorianas no dia 20 de junho. Fascistas saíram então às ruas em carros de luxo e começaram a disparar contra manifestantes nos arredores de Quito. No dia 21 de junho, a polícia invadiu a Universidade Católica, o escritório da Confederação Nacional das Organizações Camponesas (Fenocin), Indígenas e Negras e a Universidade Salesiana. Dois dias antes, a polícia havia tomado a Sede Nacional de la Casa de la Cultura Ecuatoriana, local que tradicionalmente concentra manifestantes, inclusive aqueles que retiraram três presidentes do poder no passado.
Em 30 de junho, o governo do Equador e o movimento indígena chegaram a um acordo, uma vez que o governo se comprometeu em, dentro de três meses, “revogar o estado de exceção, baixar cinco centavos do preço dos combustíveis subsidiados e não dar mais concessões de mineração em reservas naturais, zonas intangíveis, áreas de reserva de água e territórios indígenas”. A Conferencia Episcopal Ecuatoriana sediou e mediou o diálogo entre o governo e as representações indígenas. As outras demandas listadas nas reivindicações da Conaie serão discutidas em mesas de trabalho.
A conquista que a revolta popular de junho alcançou no Equador foi mais uma prova de que a classe trabalhadora organizada é capaz de impor suas reivindicações, desarticulando abusos da burguesia e do império que esta obedece. Que haja mais êxitos da luta pela democracia anticapitalista, anti-imperialista, anticolonialista e antissegregacionista na América Latina! Que os gritos em protestos amplifiquem a força do povo e seus anseios! Fora Bolsonaro! ¡Fuera, Lasso, fuera! ¡Fuera Bukele! ¡Fuera Robles! ¡Fuera Giammattei! ¡Fuera Duque! ¡Fuera Marito! Fuera Lacalle Pou!